quarta-feira, 25 de outubro de 2023

O Perdão que Traz Luz

 Acredito que em geral todos concordam que a raiva cega as pessoas.

Mas, você já parou para pensar que existem outros sentimentos e emoções que também cegam?!

Quero falar sobre a dor e como ela também pode nos cegar.

Eu achei de verdade que só o sentimento de raiva poderia nos cegar a ponto de cometermos erros influenciados por ela, mas alguns outros sentimentos também podem nos cegar e nos guiar erroneamente a caminhos obscuros dentro e fora de nós mesmos.


A diferença entre a raiva e a dor, acredito eu, está em que uma vez que a raiva

nos projeta em direção a tomar

decisões erradas em relação ao outro, a dor nos envia no caminho tortuoso das

decisões erradas contra nós

mesmos.


Por temer tomar atitudes que envergonham o nome de Deus, a minha fé, a

minha família a minha comunidade

de fé, e a mim mesma, eu me dediquei então a cuidar fervorosamente em

como a raiva podia se manifestar

em mim, cuidei de aprender tudo o que pude sobre manter a calma, perdoar,

resolver, conversar, dialogar,

suportar, aguentar, esperar, ter paciência, enfim, eu me dediquei em forjar

um caráter onde eu não tivesse

que agir sem pensar e magoar, ferir, atacar ou agir de forma grosseira com

outras pessoas, e isso funcionou

bem, ao menos em parte.


Não perdi meu réu primário atacando ninguém, apesar de ter vivido

situações com pessoas que provaram

com força a minha resistência e a minha paciência. Mas, exceto uma

discussão e explosão de raiva com

palavras torpes que tive com uma cunhada a mais ou menos uns dez

anos, eu consegui sobreviver a

s provocações e reações naturais que a raiva traz. Mas, apesar de não

ter perdido meu réu primário,

eu perdi meu amor próprio.


Aprendi com o tempo, que sempre vão existir pessoas que parecem

viver tranquilas com seus impulsos

atormentadores e provocadores e essas pessoas sempre cruzarão o

nosso caminho cabe a nós mantermos

a calma, respirarmos e seguirmos firmes no propósito de não fazermos

nada que nos traga arrependimentos

futuros.


Pode haver justificativas plausíveis para algumas reações intempestivas e

impensadas, mas nunca nos

livraremos de suas consequências, dessa forma prevenir que a raiva nos

leve a atitudes de violência,

brigas, desentendimentos ou divisões, ainda é a melhor decisão.


O episódio que citei anteriormente com a minha cunhada, foi terrível

para mim, pois ele me cobriu

de vergonha, no entanto esse momento de fracasso pessoal me levou

ao arrependimento e então à

lições profundas, e também a decisão de que definitivamente eu não

estava disposta a sentir e nem

a viver aquilo novamente em minha vida. Eu tenho trabalhado com

afinco para que isso nunca mais

se repita.


Dizer coisas ruins a quem amamos (ou mesmo a desconhecidos, ou sobre eles)

é extremamente

destrutivo para a nossa alma e compromete o nosso caráter. Perdoar,

relevar, suportar e pensar duas

vezes, ou mais vezes se for preciso, nos habilita a viver uma vida com

menos arrependimentos dolorosos

e menos problemas para resolver no dia seguinte, nos instrui a ter um

relacionamento melhor entre a

nossa cabeça e o nosso travesseiro no fim do dia, e nos poupa de

sérios desgastes emocionais.


Mas, (sempre tem um mais né?!) o que eu não percebi é que não

bastava evitar que a raiva me dominasse,

não bastava proteger a mim mesma e aos outros das consequências

de permitir que a ira me dominasse,

não bastava exercitar o domínio próprio e não reagir ao mal que as

pessoas estavam me fazendo passar

ou viver, eu não percebi que precisa também aprender o que fazer

com a dor que a atitude ruim das pessoas

me causava.


Sem nenhuma falsa modéstia eu aprendi a ser mais tolerante, mais

paciente, mais amigável, compreensiva,

perdoadora, prática no trato e nas reconciliações, mais assertiva em

relação às situações delicadas

e possivelmente problemáticas. As pessoas do meu círculo íntimo

costumam me qualificar como alguém

com sabedoria acima da média para lidar com conflitos.


Contudo, não adiantava eu não reagir ao mal que me faziam eu

precisava aprender a transformar isso em

algo bom dentro de mim.

Porque com o tempo eu descobri que os extremos sempre nos levam

a abismos, e não adiantava eu me

abster de pecar ao calor da ira, proteger a minha reputação, trabalhar

para não envergonhar a minha fé

e a minha família, se no fim eu seria destruída de dentro para fora.

Porque é isso que a dor faz, ela nos

destrói de dentro para fora.


O que estava faltando eu aprender é que todo mal que nos fazem

tem uma consequência, a primeira podemos

aprender a controlar que é uma reação à altura, uma resposta tão

negativa quanto, ou maior, do que aquilo

que nos fizeram.

Se a primeira podemos controlar, a segunda consequência é que

precisamos aprender a cuidar, cuidar de

perceber quanto mal nos fizeram, qual a profundidade e importância

que vamos dar a isso, o quanto isso

nos marcou e nos machucou e cuidar disso.


Na primeira você oferece ao outro misericórdia, que significa não

dar aquela pessoa o que naturalmente

acreditamos que ela merece, e na segunda precisamos oferecer a paz,

pois só a paz pode nos livrar da

prisão que a dor pode ser, só com a paz podemos receber cura e

libertação das sequelas profundas que

a dor pode causar.


No fim, eu percebi que havia me preocupado tanto em não machucar

os outros, havia ficado com tanto

medo de errar diante de Deus, dos homens e de mim mesma que eu

nem percebi que havia ficado

vulnerável demais no extremo oposto, eu não havia aprendido a

cuidar de mim.


Uma vez que poupei os outros, esqueci de me poupar, me concentrei

tanto em não atacar, que acabei

permitindo ataques que jamais poderiam ter acontecido. Fiquei tão

preocupada em ser politicamente

correta, espiritualmente aprovada e humanamente aceitável, que

esqueci de princípios básicos como,

respeito, cuidado e amor próprio.


Esqueci que o mandamento é “amar o próximo como a si mesmo”,

esqueci de me amar, de me proteger,

de me cuidar, de me aceitar, impor limites, me afastar e desfazer nós

com quem não estava comprometido

em criar laços verdadeiros comigo.

"E o segundo é semelhante a ele: 'Ame o seu próximo como a si mesmo'."

Mateus 22.37


Entre a cegueira da ira e a cegueira da dor, eu me perdi na cegueira

das minhas dores que me levaram

a aceitar o inaceitável, a aceitar migalhas mesmo que sempre oferecesse

um banquete,  a cegueira da dor

me levou a mendigar por aquilo que eu sempre fui rica, pedir pelo

mínimo mesmo oferecendo o máximo,

esperando paralisada pelo que jamais iria chegar.


A cegueira da dor me fez acreditar em mentiras sobre mim, me fez

acreditar que de alguma maneira eu

merecia o mal que me faziam, ou pior, que eu era a culpa pelo mal

que me faziam, a cegueira da dor me

fez acreditar que eu não merecia ser tratada com respeito, proteção e

segurança, que eu sempre tinha que

pagar por tudo o que eu precisava, a cegueira da dor me fez fraca,

vulnerável, doente, carente, medrosa,

frustrada e acima de tudo me deixou com sequelas que me levaram

ao consultório psiquiátrico e psicológico.


É isso que acontece quando andamos por extremos, é isso que acontece

quando não compreendemos

princípios básicos de sobrevivência como amar a si e depois ao outro,

é isso o que acontece quando exigimos

demais de nós mesmos sem colocar limites nas relações com as

pessoas, é isso que acontece quando você

oferece aos outros apenas o perdão sem a responsabilidade, a desculpa

sem a retratação, o tempo sem o

diálogo, a chance sem o posicionamento, a graça sem decisão e

mudança gera injustiça e suas sequelas,

a misericórdia sem comprometimento gera abusadores.


O mesmo Deus que é capaz de perdoar um pecado causado pela ira

é também capaz de nos curar da dor

causada pela maldade, no primeiro caso ele nos fará ver a luz que o

perdão traz e nos livrará da cegueira

do orgulho e do egoísmo e no segundo caso ele nos fará ver a luz que

perdoar a si mesmo traz, e nos livrará

da cegueira da carência, da necessidade de aceitação e principalmente

vai nos ensinar a estabelecer um

padrão de comportamento saudável nas relações consigo e com o

próximo e também nos ensinar a selecionar

e decidir pelo que é melhor para nós ao invés de aceitar qualquer

coisa que nos é oferecido.


A ira cega, a dor também cega, para o primeiro caso o perdão é a

cura, para o segundo, perdoar a si

mesmo é a cura.


A ira que cega, nos mantém numa dinâmica de egoísmo, orgulho

e soberba, a dor que nos cega nos mantém

numa dinâmica de comportamentos carentes, frustrantes, cansativos

e repetitivos.


Que tenhamos coragem para perdoar o mal que nos fazem a ponto

de não reagirmos a isso, perdendo a

paz do nosso coração, e que estejamos dispostos a perdoar a nós

mesmos quando permitirmos que o que

nos fizeram toque a nossa alma, assim vamos recuperar a paz que

cura e nos liberta.


No perdão ao outro cultivamos o amor ao próximo e o domínio

próprio, no perdão a nós mesmos cultivamos

o amor próprio e a paz do coração.


"Quando ficarem irados, não pequem; ao deitar-se, reflitam nisso

e aquietem-se." Salmos 4.4

Danny Noronha 

25/10/2023

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